(sem título)

18 de fevereiro de 2020

Porque é que não lhe perguntas? Medo? De quê? Tenho quase a certeza que ela não te vai morder. Quer dizer, sabendo quem é, não ponho as mãos no fogo nem nada, mas, ahm. Anda, estou a brincar. Pensa assim - qual é a pior coisa que te pode acontecer? E então? Achas que estás melhor como estás agora? Olha, está bem, se tu não a convidas, convido-a eu. Pode ser?

És mesmo cego. Ela gosta de ti. És a única pessoa no universo inteiro que ainda não se apercebeu isso. Porque é que havia de te estar a mentir? Enfim, acredita no que quiseres. Não te percebo às vezes. Para alguém que parece ser tão inteligente, tens uma cabeça-dura...

Tentar uma coisa diferente, então. Imagina-te daqui a uns dez anos. Canudo na mão. Trabalho qualquer. Uma outra rapariga a teu lado que gosta de ti. Talvez gostes dela também. Ela é bonita, ouve as mesmas bandas estranhas que tu, talvez isso chegue. Estão a viver juntos num pequeno apartamento alugado nos arredores da cidade. Volta e meia vocês falam de um futuro juntos - ter filhos, comprar uma casa, esse tipo de coisas - mas ainda é cedo para ti. Ainda há muito que queres fazer antes disso. Visitar outros países, ou viver sem todas essas preocupações enquanto és novo.

O que interessa é que, ao final do dia, és feliz. Às vezes. A verdade é que não sabes muito bem o que é que isso significa. Há noites que ainda sonhas com ela. Há dias que gastas a pensar, o que é que estou a fazer? É confortável, pelo menos. Se olhas à tua volta, vês tantas outras pessoas a levar uma variação da tua vida, por isso não podes estar assim tão longe da razão.

Mais dez ou vinte anos. Não sabes onde estão os teus amigos. Casaram-se, tal como tu, e esconderam-se num sítio qualquer. Dois filhos - um menino e uma menina. Ela com algumas parecenças contigo, coitada. E eles são luz da tua vida. Já esqueceste a ideia de ser feliz - cabe-lhes a eles essa responsabilidade, agora, contigo a ajudar. A ti, e à pessoa a teu lado. Essa, que mudou já tantas vezes. E tu? Todos os teus sonhos e aspirações. Todo o teu ideal sobre um grande amor. Não és já a mesma pessoa.

Quando fechas os olhos, à noite, e sussurras bem baixinho para que a lua te leve de volta, apercebes-te que não era bem isto que querias para ti. Já vais um pouco atrasado. A tua boleia já partiu. Um dia de cada vez, e ficaste a ver a vida passar sem sequer dares por ela. O desejo de voltar atrás, até onde estás hoje, para tentar algo de diferente.

E aqui estás tu. Ouve, eu sei que isto é parvo. Eu sei que pode nem sequer ser aquilo que te espera à medida que fores seguindo o teu caminho, mas não vivas atormentado pela ideia daquilo que podia ter sido. Há poucas coisas tão dolorosas quanto olhar para trás, passado um tempo, e pensar - e se?

Por isso, faz-lhe lá o raio do convite. Se não for para ser, não é, mas ao menos ficas com essa certeza.