Sobre um sonho
12 de setembro de 2021Escadarias atrás de escadarias num labirinto de salas e salões e recantos escondidos num edifício que ia jurar não ter fim. In media res numa espécie de festa: burburinho de fundo, cheiro a tabaco, pessoas bem vestidas de copos na mão e rostos em sombras e amarelos por lustres suspensos em motivos florais de estuque que se alastram do tecto para toda a parte. Dos degraus em mármore bege ao ranger do soalho velho quando chegamos ao terceiro andar, suave soar da cadência da chuva no telhado ao cruzar-me contigo lá ao fundo, primeira de várias vezes. Acenamos discretos quando se dão os olhares e seguimos conversas interrompidas, sempre por acaso em sítios acomodados pela vastidão da noite e pela noite sem fim. Quando nos arrastam no fim de fartos de nós e nos deixam de guarda-chuva a sós lá na entrada da boa sorte, quando te vejo e respiro e engulo o nó e o turbilhão que nos enche, eu sei, é isto, agora, a combinação que nos faz em meia dúzia de passos e palavras antes de baterem as doze badaladas, e é no teu calor que sinto que talvez um dia vá ser real.